A Janela de Johari
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Pelos idos da década de cinqüenta, dois psicólogos criaram um conceito interessante de percepção: existem características sobre mim que todos conhecem, porém, há algumas, que são secretas para as outras pessoas e só eu as conheço; outras, apenas as pessoas são capazes de perceber, enquanto eu me iludo afirmando-as ou negando-as; por fim, existem outros aspectos que tanto eu como os outros desconhecem. Em homenagem aos dois estudiosos, chamou-se de Janela de Johari essa ferramenta (anagrama composto com as iniciais deles: Joseph e Harry).
Tradicionalmente, a Janela de Johari é representada por um quadrado dividido em quatro quadrantes, onde na primeira linha põe-se o que os outros conhecem de mim e na segunda o que desconhecem; já a primeira coluna é composta dos aspectos que estou consciente em minha personalidade, contrastados pela segunda coluna (pontos “cegos”, ofuscados ou mesmo totalmente desconhecidos).
O entendimento do conceito é fácil. Imagine que você mora em uma casa bem pequena toda feita de vidro transparente. As pessoas que passam pela rua poderão ver aquilo que você faz e você as vê normalmente, esta é a área pública, de livre acesso, aberta a todos, trata-se dos momentos de autenticidade. Contudo, em algumas ocasiões, suponhamos que, por vergonha, medo, insegurança, ou pelo desejo de privacidade, você coloque uma cortina em um dos estabelecimentos, talvez, na área onde você guarda seus tesouros ou seus segredos mais sombrios, esse espaço reservado é o que se chama de zona secreta ou privada.
Agora imaginemos outra situação. Nessa casa não há espelhos, por isso, você não é capaz de saber como está seu rosto, mas os outros, que estão de fora, o vem perfeitamente. E mais: a multidão lá fora, são todos psicólogos comportamentais. A todo momento estão avaliando seu comportamento e através disso descobriram traços na sua personalidade que você desconhece completamente. A isso chama-se de zona cega, blindada.
Por último, imaginemos que a casa onde você mora possui um sub-solo, mas você nunca foi por lá, nem seus observadores conhecem o que se esconde naquela zona. Podem ser talentos adormecidos, habilidades ignoradas ou potencialidades perversas. Somente quando você se sentir bastante pressionado é que irá se aventurar em incursões por suas áreas desconhecidas, ignoradas ou, em linguagem mais técnica, pelas zonas do inconsciente.
Tracemos algumas linhas gerais sobre a temática.
Considera-se o primeiro quadrante como sendo uma janela “aberta” a todos. Seria uma espécie de cartão de visitas que ofertamos a todos. A tão famosa “primeira impressão”. Estima-se que, em um único contato, entre duas pessoas ocorram entre dois mil até dez mil tipos de sinais corporais, mudanças de tonalidade, imagem, temperatura, tato, odor corporal etc. Isso quer dizer que, em um primeiro contato, mostramos muito sobre quem nós somos. As pessoas mais sensíveis têm facilidade em captar esse estímulos e transformarem em informações conscientes. Por isso, tem indivíduos que simpatizam ou antipatizam alguém logo de cara.
Digamos que nessa zona pública, você apresenta ao outro aquilo que você sabe que é e que gostaria que ele conhecesse. Aqui a transparência predomina: seus pontos fracos e fortes são expostos, suas experiências, seus sentimentos, seja porque você confia no interlocutor ou porque se sente seguro de si para falar sobre suas qualidade e defeitos.
Contudo, o fato da “janela” encontrar-se “aberta”, torna você vulnerável a “incursões” e “ataques”. Por isso, nem sempre é fácil ampliar tal quadrante. Em geral, o diminuímos para dá espaço maior à nossa “zona secreta”. Esconder dos outros o que somos é uma forma de segurança, de proteção. Todo ser humano busca proteção. Contudo, há um preço: você corre o risco de ser mal interpretado. À medida que você adquire confiança em alguém, essa zona tende a reduzir-se em detrimento de um “eu aberto”.
A busca de aceitação leva-nos, por vezes, a criar um personagem, uma fachada, para nos escondermos e podermos ser inseridos no grupo. Acontece que em algumas ocasiões, acabamos por acreditar em nossa própria invenção: ou julgamos mais do que somos ou nos subestimamos.
Contudo, as outras pessoas também nos interpretam e aspectos de minha personalidade que eu ignoro, escondo ou rejeito são descoberto por outras pessoas. Você as denuncia de forma inconsciente e os outros percebem. Uma pesquisa já antiga revelou que 93% do que dizemos a uma pessoa não vem de nossa boca, mas da entonação da voz e da linguagem não verbal. Outro dado interessante é que esse tipo de comportamento não pode ser disfarçado por completo.
Quando nos deparamos diante das afirmações que um outro faz sobre nós, a maior parte das vezes, por nunca termos percebido tal dimensão, tendemos a projetar sobre os outros aquela característica, principalmente, se for negativa.
Por outro lado, ficar atendo ao que os demais falam a nosso respeito pode nos render importantes descobertas sobre nossa personalidade.
Por fim, existem as potencialidades do inconsciente, a zona desconhecida que remete aos mecanismos de defesa desenvolvidos desde a mais tenra idade. Aqui estão as lembranças, coisas que foram excluídas, reprimidas, censuradas, as razões de muitos de nossos comportamentos. Essa zona, para a grande maioria das pessoas, é a maior e a mais difícil de ser reduzida, visto que seu conteúdo é acessível apenas através de técnicas especiais como a psicoterapia ou em estados de “choque”. É, por exemplo, a típica história dos protagonistas de filmes e livros que inicialmente são bastante frágeis e limitados, mas que após passar por uma série de dificuldade se percebe o crescimento e descobre traços de sua personalidade que antes eram desconhecidos. A meditação também pode ser importante instrumento para o autoconhecimento.
Algumas últimas observações sobre a Janela de Johari. Não se trata de um modelo engessado. Ele está em constante movimento e modificação, dependendo da situação em que estamos e das pessoas ou grupos com quem nos relacionamos. Por exemplo, quando estou com um amigo mais íntimo minhas zonas cegas e secretas tendem a diminuírem e a zona “aberta” aumenta. Já diante de um desconhecido é capaz de a zona de fachada se ampliar.
Quando analisamos, cuidadosamente, esses quatro estágios, áreas, dimensões ou zonas do “eu”, percebemos sua riqueza e utilidade, podendo ser aplicado a indivíduos e grupos para a auxiliar o conhecimento interpessoal ou mesmo intrapessoal. Existem várias dinâmicas, testes e livros com esse intuito. Mas, sem dúvida, a forma mais simples de ampliar nosso “eu aberto” é através do diálogo e o modo mais eficiente de diminuirmos nossa “zona cega” é estarmos dispostos a receber feedbacks de nossos companheiros de trabalho. Dessa formo, todos podem crescer.
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